Ele era um senhor curioso. Tinha cabelo acinzentado, um sorriso escondido e um olhar com brilho a solidão. Gostava de espreitar pela montra da sua barbearia o dia a dia de quem por ali passava. Os vidros eram limpos várias vezes para a transparência ser ainda maior.
Ao longo do seu dia atendia vários senhores e fazia-lhes a barba à navalhada ao som de Edith Piaf, a sua musa. Começava por colocar a bata branca e indicar a cadeira. De seguida, afiava cuidadosamente a navalha, espalhava o creme de barbear, aumentava o volume e de atenção repartida entre a Edith e o movimento de barbear, começava a cortar os pelos ao cliente.
Quando numa manhã de outono, as folhas alanrajadas cobriam os desenhos da calçada portuguesa, que decoravam a entrada da barbearia, o barbeiro sentiu uma dor forte no peito. Perdeu a força e sentiu o seu corpo cair. No chão ficou o fraco gemido que ninguém ouviu e que logo se perdeu no meio de todo aquele quadro alaranjado. Os sentidos rapidamente abandonaram o seu corpo para irem ao encontro tão desejoso da sua musa. Já nada o fazia ficar.
Foi assim que o barbeiro do Barreiro se deitou no chão pela primeira vez e viu como o céu era tão maravilhoso e cheio de sons. De barriga para cima deixou-se levar e abandonou o seu olhar com brilho a solidão e foi ser FELIZ!
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